26 de jul. de 2012

Meio-céu




para Natália Parreiras


todo poema é nada
ante o céu claro
que te aguarda em dia

para trazer tudo meu
que eu larguei contigo:

todas as minhas noites
em claro
todos os tombos, tratos
e pedidos.

até a metade
do meu céu
ou a metade
da tarde
            do galo
            da rua,
a metade
nua de mim.

todo verso é a metade
do verso remetido a ti
todo tempo é a metade
do tempo que roubastes

todo poema é a metade
do poema que seria
            ou a metade
            do passo
            do posso
            do para
a metade
sua de mim.

nem todo começo
termina no fim
porque nem tudo começa
onde se pensa que sim

nem tudo completo
é poema

porque todo poema é nada
ante a metade do céu
existindo em ti.


Rio de Janeiro, 18 de julho de 2012.

2 de jun. de 2012

Para Nikos Kazantzákis



Marquei a liberdade
no meu corpo
para deixá-la em mim
sem q'eu me deixe,

para fazê-la minha
sem q'eu me tenha,
para querê-la assim
como eu me quis,
para esquecer de mim
sem q'eu me perca.

Para saber a beleza de todas as coisas
e das fragilidades
e das levezas
do amor natural

presente em todas as coisas,
presente em todos os seres,
em todos os braços,
calos, corpos e cabeças.

Para ser vivo todos os dias
todos os dias - mesmo que morto -
vivo nos presentes,
nos amores,
nos livros
e nas marcas q'eu deixei

graças à liberdade
q'eu marquei em mim.

5 de fev. de 2012

Construção civil




Nem as colunas jônicas
Dos templos perdidos
Podem sustentar a vida,
Tampouco os Mênades
Ou as bruxas de Circe,
Os seguidores de Apolo
E quem clama por Hera.

Constrói-se tudo
Para que não desabe.

Mas só o poeta faz
O que faz visando os cacos,
As pedras e a poeira
Que nascem plenas da sujeira
Desmoronada.